O sucesso de Marvel Snap pode ser repetido com cartas reais?

Magic: The Gathering” iniciou um novo conceito de card game em 1993, exigindo que cada jogador forme seu próprio baralho para iniciar a disputa. Em 2004, o card gameAstral Masters” apresentou uma solução para o azar nos terrenos de mana no Magic e colocou pontos de vida nas criaturas.

Marcar a vida de criaturas em card games não é impossível, mas é complicado, pois envolve muitos marcadores em cima das cartinhas. Já em mídia digital, como é o caso do “Astral Masters”, essa marcação fica automática.

Assim como “HearthStone” (2014), “Marvel Snap” (2022) se aproveita da sua mídia para criar regras que seriam impossíveis em um card game físico.

Fórmula do Sucesso

Além do capricho na produção, “Marvel Snap” utiliza um combo de regras que se encaixa perfeitamente nos interesses de um jogador casual.

  • Tempo: O jogo é muito rápido, em 6 turnos, menos de 5 minutos médios de duração;
  • Mecânica Simples: Com 3 movimentos em um tutorial, o jogador entende todos os conceitos do jogo. É um jogo de domínio de 3 terrenos por pontuação, com espaço para apenas 4 cartas em cada um;
  • Pausa para o Aprendizado: Depois das regras básicas, o jogador só precisa de atenção para os novos terrenos e as novas cartas, que podem apresentar novas regras; sempre que uma nova carta aparece, o jogo é pausado e a carta aparece em destaque para o jogador ler seu texto;
  • Ação Simultânea: Os dois jogadores posicionam suas cartas ao mesmo tempo, sem que um veja o posicionamento do adversário;
  • Gráficos e Efeitos: Além da excelente arte das cartinhas, o jogo apresenta efeitos específicos para cada personagem quando ele entra em ação;
  • Representação dos Personagens: As regras simulam características específicas dos personagens (Wolverine se regenera, Feiticeira Escarlate altera o terreno, Gambit destrói cartas, …);
  • Rejogabilidade: Os terrenos têm características específicas (-1 poder por turno, trocar cartas de lugar, dobrar poderes, …), e entram aleatoriamente a cada partida, exigindo improviso dos jogadores a cada terreno revelado;
  • Incentivo ao Replanejamento: Eventualmente, é indicada a maior frequência de um terreno nas partidas, obrigando os jogadores a criarem decks para tirar proveito disso ou anular decks feitos com esse fim (mais rápido no início, mais lento depois);
  • Coleção: Mesmo sem investimento financeiro, e mesmo sem ganhar a partida, o jogador ganha novas cartas conforme joga;
  • Fator “Truco”: O ranqueamento entra como metajogo, e os jogadores podem apostar mais pontos de rank durante a partida (essa aposta é batizada de “Snap”).

Conversão para o Físico

Será que dá para utilizar todos esses elementos do “Marvel Snap” em um jogo físico?

  • Tempo: Já temos card games rápidos, mas dificilmente, com a mesma pouca duração e quantidade de elementos. Um detalhe que pode entrar na comparação é o setup do jogo: no videogame, temos o tempo de carregar o jogo e esperar o pareamento de jogadores, mas depois disso, já está tudo pronto, e quando entram aquelas cartas que fazem mudança no cenário, as mudanças são automáticas, não é necessário ficar buscando marcadores ou cartas específicas;
  • Mecânica Simples: Sim;
  • Pausa para o Aprendizado: Sim;
  • Ação Simultânea: Cada jogador precisaria de uma barreira, para esconder do adversário onde estão sendo posicionadas as suas cartas;
  • Gráficos e Efeitos: Enquanto a tecnologia de Hogwarts não puder ser aplicada em cartas de trouxas, os card games físicos não terão os mesmos efeitos de “Marvel Snap”, porém, a satisfação de manipular cartas de qualidade pode até superar a visualização de animações em um celular;
  • Representação dos Personagens: É aqui que a conversão fica impossível. Com dedicação dos game designers, essa customização pode ser feita para cada personagem, porém, não do jeito que é feito em “Marvel Snap”.

As regras utilizam elementos que envolvem modificações nos atributos das cartas, o que exigiria uma grande quantidade de marcadores e algum tempo para tentar organizar todos esses marcadores nas cartas.

Para impossibilitar a conversão, temos alguns absurdos: modificação em cartas enquanto elas ainda estão na mão ou no deck, inserção de cartas aleatórias que não fazem parte dos decks dos jogadores e multiplicação de cartas.

  • Rejogabilidade: As cartas de terreno poderiam ser sorteadas no começo de cada partida;
  • Incentivo ao Replanejamento: Os jogadores poderiam combinar a maior probabilidade de entrada de algum terreno;
  • Coleção: Já temos isso, mas pagando por cada booster;
  • Fator “Truco”: Aparentemente, sim; mas estamos falando de uma interação entre uma partida e o ranqueamento. Atualmente, as apostas feitas interferem apenas no resultado daquela partida; em “Marvel Snap”, sua aposta vale para o que acontece fora da partida.

O Pareamento

Nesse ponto, fica difícil de qualquer jogo físico concorrer com um jogo online.

A internet facilitou a expansão dos jogos multiplayers, e mesmo com menos chance de vitória e com uma experiência narrativa inferior que em jogos single-player, humanos gostam de jogar contra outros humanos.

Nos jogos físicos já temos isso, e bem mais intenso do que em um jogo online. É inegável que a satisfação em uma jogatina física é bem mais intensa do que em uma sessão online, porém, temos que lidar com dificuldades e frustrações para se encontrar no presencial.

O jogo online está disponível no momento que você quiser (se for um jogo de sucesso com milhares de jogadores ativo), enquanto que o jogo presencial precisa de toda uma combinação e disponibilidade entre os jogadores (a não ser que, em sua cidade, você tenha um espaço público para essas atividades, como as Tardes de Jogos e as Noites de Jogos em Catanduva).

Quando o jogo depende não só da habilidade dos participantes, como também das cartas que ele já tem, o pareamento tem um papel fundamental. Sem esse pareamento, um jogador iniciante, ou um jogador ruim mesmo, terá uma quantidade de derrotas muito grande, que tirará o interesse do jogo.

Qual é melhor?

Mesmo com todas essas inovações, um jogo online não consegue substituir a satisfação de interações humanas em uma mesa de jogo real.

São muitos argumentos lógicos favoráveis ao “Marvel Snap”, mas o emocional sempre faz diferença nas decisões humanas, e além disso, uma atividade não exclui a outra. Nada impede de usufruir do melhor dos dois mundos, mas não vai ficar olhando o celular durante a jogatina!

Texto: Roj Ventura

Revisão: Thalim